Ao fechar a venda do apartamento, dona Lourdinha entregou as chaves para os futuros moradores com flores e chocolates. Ela ainda deixou como “recordação” o jogo de aparador e espelho que até hoje está na sala de jantar, agora acompanhado por fotos antigas da família da stylist Mariana Sucupira. “Fomos recebidos com esse carinho, que nunca me esqueço”, conta ela, que há cerca de dez anos vem enchendo de novas memórias o imóvel de 300 m² na região da Praça da Liberdade, ponto de referência para os belo-horizontinos. Curioso pensar que as duas foram vizinhas – antes de fechar a compra, a família alugava um apartamento no oitavo andar e, em outros tempos, morar nesse prédio era um sonho da Mariana adolescente, que visitou uma amiga na década de 1990 e se apaixonou pelo edifício moderno tão bem localizado na sua cidade do coração.
A lida diária com a moda empresta referências que ajudam a profissional a compor a decoração do espaço. “Penso que é quase o mesmo trabalho, apenas realizado em escalas diferentes; no dia a dia, visto o corpo de uma pessoa, enquanto ao longo desses anos fui vestindo o lugar onde vivo”, reflete, com a calma de quem já entendeu que não é preciso ter pressa para acabar essa montagem. Os móveis, por exemplo, chegaram e rapidamente encontraram seus lugares. Não são lá muito de passear pela casa. O mesmo não acontece com as obras de arte, muitas delas surgidas pelas mãos – e pelo olhar – das amigas de longa data: Flávia Albuquerque, nome à frente da galeria Albuquerque Contemporânea, e Susana Bastos, artista plástica e sócia do arquiteto Marcelo Alvarenga no estúdio Alva Design.
As peças andam pelos ambientes e ganham novos companheiros frequentemente, preenchendo mais um pouco as paredes, que, ainda assim, mantêm a leveza. Numa cidade como Belo Horizonte, esses laços de amizade passam de fios a tramas com facilidade. “Minha formação original é em direito e eu nunca havia pensado em seguir uma profissão pouco convencional, mas a mãe de uma amiga me puxou para esse universo, eu gostei e fiquei.” Até hoje cabe a Mariana o styling de grande parte das coleções de Graça Ottoni, a responsável por abrir esse caminho. História semelhante aconteceu ao conhecer o amigo Luiz Claudio Silva, da marca mineira Apartamento 03.
Essa coletânea de pessoas queridas abastece a família de afetos. Mariana divide o endereço com o marido, os dois filhos e a cachorra Zelda, e espalha pelo imóvel elementos que chama de “retratos de outros momentos”. É o caso, por exemplo, do sofá e das poltronas que pertenceram ao avô do marido, imigrante do leste europeu que se apaixonou pelo Brasil, virou historiador e escreveu livros sobre períodos importantes do passado; ou da escultura e do pequeno autorretrato feitos por dona Irene, a avó, ambos em destaque nas salas de jantar e estar. Ela mesma também exibe marcas da sua trajetória pessoal. Quando pequena, o pai, engenheiro, levou a família para uma temporada de trabalho no Iraque – vieram de lá os muitos tapetes artesanais espalhados pela casa. E há outro marco importante que fica logo na entrada da residência: a pintura dos filhos ainda crianças, um presente encomendado pelo marido. Memória que, assim como o lar onde está, segue vivíssima, alegríssima e em constante evolução.
*Matéria originalmente publicada na Casa Vogue de outubro. Garanta a sua aqui!